13/10 - Milano

Hoje seria (na verdade, ainda está sendo) o dia maligno da viagem: 17 horas dentro de um ônibus, quase sem tirar de dentro, com apenas 3 horinhas e pouco de parada em Milão, numa estação de ônibus longe de tudo, como costuma ser com a Flixbus, que só pára em rodoviária decente quando é a única na cidade. Noite passada dentro do ônibus, chegando no dia seguinte apenas às 6 da manhã. Cara, eu tô velho demais pra carregar o peso da minha mesquinhez nas costas...

Almoçamos umas linguiças de um restaurante de comida dos Bálcãs, com umas cebolas cruas como acompanhamento, que me deixaram com uma flatulência bucal pelo resto do dia.

Cruzamos, de Bregenz à Itália, os alpes suíços, passando pela bela Lugano, lá no alto da montanha, e por várias paisagens instagramáveis, que acabava não dando tempo para fotografar.

Na corrida de ontem, descobrimos que um grupo de 120 brasileiros, de Fortaleza, havia fechado um pacote para participar da prova. É bem capaz de ter havido mais brasileiros inscritos do que, sei lá, alemães. Com muito tempo livre dentro do ônibus, invadido pela musa e pelo tédio, compus um singelo poeminha para homenagear meus patrícios:


BRASSONETO COM CODA


Brasileiro é pior que piolho

Tem até em cabeça careca

De todo cu saem uns três pelo olho

E ficam lá impressos na cueca.


No caldinho de uma gonorréia

No acre aroma que sai do puteiro

Na áspera xota de uma tia velha

Sim, há lá mais de um brasileiro


No estalo bolhoso de um peido molhado

E também junto com um jato de pus

Espremido de uma espinha no sovaco.


Ou bem na cárie de um dente quebrado

Lá no cheiro que o suor produz

Naquela fedida dobrinha do saco.


Se pisou na catinga, já sabe o que é

Você está com um brasileiro no pé.


Em Milão, topei botar a mão no bolso, achando que seria a mais dolorosa despesa do dia, e tomar um metrô, pra ir dar aquela volta rapidona, meio sem rumo e sem propósito, pelo centro da cidade, em tempo de voltar dentro dos 90 minutos de uso que o bilhete facultava, e de não perder o próximo ônibus. Para isto, escolhi para o jantar uma pizzaria perto da estação, encontrada no Google Maps. E sabemos o que acontece quando se leva o Google Maps a sério: aquela merda estava fechada, o tempo ia passando, e não haveria tempo para procurar outro lugar com tranquilidade. Então fomos de sandubão de vitrine de lanchonete de rodoviária mesmo. Estavam menos qualquer coisa do que o esperado. Mas dois deles, duas cocas e um donut custaram escorchantes 27 euros! Preço de um rodízio japonês chique em São Paulo.

Com o bolso e a dignidade estuprados, restava ainda a questão: onde escovar os dentes e dar aquele plim final da noite? Os banheiros do ônibus, quando acessíveis, raramente têm água ou papel higiênico. O da rodoviária, uma cabine automática, custava 1 euro, e dava direito a 15 minutos de uso, conforme nos explicou uma prestativa mocinha italiana que também aguardava sua vez na fila. Poderíamos usar e manter a porta aberta para que o outro entrasse em seguida. Dois usos por 1 euro. E apesar de ser contra minha filosofia pagar para me apartar de meus próprios excrementos, lá fui eu morrer com 3 reais pra basicamente conseguir escovar os dentes.

Hannibal entrou primeiro, ficou lá por quase 5 minutos, retocando o batom e a tinta do cabelo, depois foi minha vez. E eis que, no meio de um descontraído xixizinho, as luzes da cabine se apagam, e começo a sentir minha pernas e pés molhados! No escuro, também a pia não liberava mais água. Na verdade, eram 5 minutos o tempo de uso, e não 15, como havia dito a menina em seu inglês hesitante. O banheiro havia iniciado o processo de auto limpeza a cada uso, e eu estava lá no meio do caminho, sendo lavado junto com a privada. Cinco minutos! Como se vira alguém com prisão de ventre dentro daquele cubículo?

Saldo da aventura: saí de lá encharcado dos joelhos pra baixo, e ainda com os dentes podrões. E bafo de cebola.


Apenas para depois constatar que o banheiro do ônibus, apesar daquele cheirinho, estava funcionando, tinha papel higiênico e água na pia. Deu até pra dar aquela lavadinha na piroca, dada a ausência de banho hoje.

E agora vou tentar dormir aqui sentado num assento de ônibus, molhado e fedendo a água sanitária. E cebola.

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