23/10 - København


O mar de merda, que ontem saiu de nossas bundas, mas hoje saiu da bunda do Senhor mesmo, estava prestes a começar. No final, teríamos basicamente um dia em Copenhagen, e dedicado ao Tivoli, mais uma folguinha um pouco maior no dia seguinte, para não ter que acordar muito cedo, já que o próximo voo sairia só ao meio-dia. Assim sendo, resolvi que acordássemos cedão, para poder ver minimamente alguma qualquer outra coisa da cidade, antes de irmos ao parque, que só abriria às 11:00.


Elegi Christiania. Quando visitei o lugar antes, há umas boas duas décadas, o clima era outro, mais sombrio, com um tanto daquela mística da tolerância ao uso de drogas, de um enclave fora do sistema, por onde se caminhava enquanto turista com uma certa insegurança. Desde então, parecem ter encaretado muito. A venda de maconha a céu aberto não existe mais, aquela precariedade toda se gentrificou, e agora  basicamente o que restou é uma comuna hippie meio malcuidada, fazendo dinheiro com artesanatos e cultura alternativa. O dia estava feio, úmido, mas ainda sem chuva.


E então, pela segunda vez em minha vida, o Tivoli. Parques de diversão, ainda que existam em quantidade um pouco menor do que elas, são como mulheres: se for possível, é melhor não repetir. Principalmente se não forem assim primeira linha, como é o caso deste: apesar de tradicionalíssimo na Dinamarca, é pequeno, com relativamente poucos brinquedos, e apenas uns poucos deles realmente radicais. Mas é o que tinha disponível nesta viagem, então, também como com as mulheres: a gente entra no que estiver ao alcance da mão.
Parque vazio, os brinquedos não tinham fila, dava pra repetir 5 vezes seguidas o mesmo aparelho, se desejado. Na verdade, era quase uma fila negativa: havia alguma espera exatamente porque os carrinhos demoravam mais para sair, porque tinham que aguardar para que chegassem interessados para enchê-los um pouco mais. Pensei: hoje vou me dar bem, e bater o meu recorde pessoal de voltas em parque de diversão. Nem me lembro em quanto ele está. Ao contrário de como com as mulheres, já que cada novo acréscimo ao currículo bate o recorde anterior, estimei que se desse umas 30 voltas, teria superado minha marca.

Meu velho companheiro de parques de diversão, o enjôo, não esteve completamente ausente, mas me incomodou menos do que em outras ocasiões. Acho que, com o envelhecer, a gente sente menos de tudo: paixão, necessidades, orgasmo, por que não náusea? Hannibal, em compensação, rapidamente foi ficando amarelada e depois verde, saiu do quarto brinquedo, o infame Aquila, com as bochechas pulsando e tentando conter o jato de vômito que depois espalhou copiosamente por uma meia dúzia consecutiva de latas de lixo pelo parque, sob o olhar atônito de algum jovem dinamarquês que passava, e pela primeira ver contemplava toda a exuberância do gorfo brasileiro. Daí para a frente, foi sempre o mesmo: após cada brinquedo, lufadas de engulhos, ânsias de cuspelhos e ondas bilíferas, até que... 
Veio a anunciada chuva. A maioria dos brinquedos fechou, os que restaram a céu aberto se tornaram praticamente chuveiradas circulares, aqueles que aconteciam sob algum tipo de teto eram os mais sem graça. Os agasalhos impermeáveis seguravam bem os troncos, mas as calças, meias, tênis iam se ensopando, até mesmo pelos punhos e pescoços a água acabava se insinuando. O vento frio piorava o desconforto. Desenvolvi toda uma técnica de, enquanto Hannibal ia vomitar mais um pouco de alguma bile marrom, tentar me aquecer e secar um pouco usando os aparelhos de jato de ar quente para as mãos do banheiro masculino, envolvido por aquele sedutor aroma de mijo. 

No final, após apenas 23 voltas, muitas delas em brinquedos bem sem gracinha, abrimos as pernas, e fomos embora às 17:30 de um parque que fechava às 22:00, ainda todo o caminho embaixo de chuva, que perdurou exatamente até chegarmos ao hotel.

Encontramos numa igreja pertinho um evento com um cara interpretando, muito bem, David Bowie na voz e violão, entremeado por pequenos sermões da ministra, em dinamarquês, do qual nada entendemos, mas achei a iniciativa de extremo frescor e simpatia. Mas com um porém: antes de a apresentação começar, estava eu fuçando no celular, tentando emitir os passes de embarque do voo de amanhã, não conseguindo entrar no site da companhia aérea, que estava fora do ar. Muito estranho... Pesquisei um pouco mais e pum!, aquela merda havia falido fazia alguma semanas, deixando todos passageiros, inclusive nós e funcionários na mão. Passei então metade da apresentação procurando um novo voo de afogadilho. Tomamos o calote da grana do voo anterior, que não vai ser devolvida nunca mais. Agora, mais uns 170 dólares por cabeça para pagar pelo novo voo, que sai às 7 da manhã, de novo ter que fazer tudo na correria, inclusive tentar secar as roupas no secador de cabelo, sem poder dormir até mais tarde amanhã. Nêgo tem que ter nascido com o rabo muito virado para a piroca do universo mesmo para dar o azar de a companhia aérea de um dos vooa quebrar no meio da viagem....

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